quarta-feira, agosto 27, 2008

12 Peão de obra

“Não mostra os dentes em obra Diana”

Esse foi o primeiro conselho profissional que recebi do meu irmão mais velho, Eduardo, formado em engenharia e já com alguns pares de sapatos gastos em terra de canteiro. Tentava nesse momento fazer-me entender que peão de obra funciona assim, na pressão. Com pouca experiência acabei assimilando esta sábia frase a duras penas. Fui atropelada por diversas transgressões de obediência e convivi num clima de tortura diária na construção e seus personagens, sendo que os clientes acabavam por me dar o tiro de misericórdia.

Ficava super revoltada ao perceber que um pedreiro não me levava a sério. Eu que era a mandante, a mim que deveria prestar contas e agia como se eu simplesmente fosse um adereço montado num par de pernas, passeando por entre as alvenarias rebocadas. Um piso mal colocado permanecia do mesmo jeito por semanas, diante das minhas insistentes solicitações para que fosse refeito. Na cabeça dos bagres o pensamento era “essa aí não é de nada, vou fazer como eu sei”. Nesse caso, o sujeito da ação era um p.h.d. em água que passarinho não bebe e eu, o objeto graduado em arquitetura.

Depois de um tempo obviamente cansei dessa vida sofrida, mudei radicalmente e virei um general em campo de concentração. Falava ríspida e reagia com mínima tolerância a qualquer manifesto por parte dos subordinados. Claro que passei a me sentir mais segura, contudo, criava uma relação de inimizade com aqueles que erguem tijolos e fazem as mesmas instalações hidrossanitárias que viriam mais tarde a causar “inocentes” vazamentos na casa do cliente que, certamente, lembraria do meu nome completo e não o do Seu José. Eu tinha mudado demais, estava exagerando, me tornara antipática e assim não havia guerreiro que lutasse junto a mim. Ainda carecia de aprender a mandar, obter mais que respeito, reciprocidade. Afinal de contas, sendo eu a esclarecida, devo ter desenvoltura para tratar com pessoas de quem preciso e que, por sua vez, dependem de mim.

Com o tempo me especializei em projetos e a convivência na obra virou tarefa da minha sócia, Ana Paula, que é mestre nas relações profissionais, os manés tão indo ela já voltou há horas. Também evoluímos nos trabalhos e hoje tratamos com responsáveis que ministram as obras e eles é que falam diretamente com seus peões. Mesmo assim tenho que visitar periodicamente a construção, ver se está saindo conforme planejamos, debater com toda a equipe os problemas que vão surgindo no decorrer do percurso e conviver com momentos de diálogo multilíngue universal.

Chego na obra e conto piada dos gremistas para os mesmos, saúdo os colorados que me contam outras piadas dos gremistas. É engraçado que os gremistas quando contam alguma piada de colorado não o fazem diretamente a mim, postam-se ao meu lado e falam alto uns com os outros. Já eu, falo o quanto preciso, descontraio o necessário, não mostro os dentes em vão e, principalmente, cobro resultados com natural firmeza. Descobri que quando confiantes os serventes desenvolvem idéias criativas para problemas incomuns. Ajudam muito e sentem-se importantes, integrantes de uma equipe em missão especial. No entanto, jamais os deixo esquecerem que diante do trabalho mal feito eu “monto num porco!”. Enfim, depois de apanhar muito consegui enfiar no céLebro deles o seguinte: “faço bem feito porque gosto de trabalhar com essa galera, é de onde tiro meu sustento e porque se não ficar bom a guria vira um cão raivoso”.

Eu não tenho um super mega escritório. Não ministro palestras sobre gestão. Agora, não preciso fazer outra faculdade pra saber que jogador de futebol é igual a peão de obra. Se o Tite não tem habilidade para domá-los, contratem um empreiteiro como auxiliar técnico.

Tem que jogar a vida e temer a morte nesse grenal.

12 Comentários:

diana oliveira disse...

louis, my boss, fica a vontade pra passar meu tópico pra baixo e deixar o lançamento do filme em evidência.

bjs

Schroder-EUA disse...

Valeu Diana depois passo pra cima denovo... :)

Marimas disse...

Perfeito guria... estávamos sentindo tua falta já...

Eu, filho de eng.º, cresci em obras e fui inclusive "batizado no trecho", como gosta de dizer a peonada cigana, que assim como o meu coroa, mudava de obra, cidade e até estado, conforme a necessidade da construtora.

Com 17 anos resolvi brincar de obra tb... e entendo em parte o teu martírio, pois, apesar de não ser mulher, o que faz muita diferença no ambiente da contrução civil, era tb um novato, caído de pára-quedas, com idade pra ser filho dos caras, mas tendo que tentar fazer com que as coisas saíssem do jeito que eu queria... na verdade do jeito que a empresa queria que eu quisesse, hehee... Eu era pra eles, como ouvi em alguns oportunidades, mesmo que pegando o mesmo sol de rachar na cabeça que eles, enfiado em concretagens em alguma dessas lajes de POA, um "modelo na obra".

E não é mole! Por isso hj, dou muito valor ao meu AutoCAD e ao ar-condicionado aqui do trampo... hehehe... não sei mais o que é o dia a dia de obra há uns 3 anos. E não sinto a menor falta.

E a atitude do Nilmar se negando a treinar cobrança de pênaltys foi classica de peão que não dá importância aos mandamentos do mestre de obras, porque pelo que se viu, para ser eng.º o nosso amigo Tite vai ter que remar muito... não que isso seja garantia de nada, afinal o Píffero é do ramo.

Fora isso, tudo de bom pra ti aí em terras estrangeiras... e boa sorte pra nós hj de noite... vamos precisar.

Daniel Chiodelli disse...

Pois é, Diana, pelo que se tem notícia, os nossos peões estão pensando "esse aí não é de nada, vou fazer como eu sei" e o resultado tem sido aqueles "inocentes" vazamentos em campo.

Mas esse empreiteiro que nós já tivemos em outras épocas: Paulo Paixão. Esse conseguia unir a peonada.

Tempos difíceis.

diana oliveira disse...

daniel, perfeito. mais q perfeito.
o empreiteiro a q me referi é mesmo o paulo paixão, ia escrever isso mas deixei quieto, grande observação.

marimas, tu sabe exatamente do q falo né... é drurys a peonada.
meu irmão uma vez teve q buscar um na delegacia pq foi pego agredindo a dona do boteco onde tava quebrando tudo pela cachaça. resultado, o peão breaco queria pegar meu irmão depois, de facão e tudo! isso foi numa obra no interior da bahia.
hehehe

a rapadura é doce, mas não é mole não.

bj

cjr-sp disse...

O grande problema de hoje em dia nessa comparaçao que a DIANA fez, é fazer com que um cara que ganha uma mini-fortuna obedecer.

É como o Marimom falou aí acima...o cara nao quiz treinar penaltis.

Aí é meio complicado. O que se faz num caso desses ?

E pior, imagina o exemplo de insubordinaçao dos outros vendo aquilo....é aí que o vestário vai por agua abaixo...

Muitos falam na volta do paixao...

Há de se lembrar que naquele time, todos tinham sede de vencer, ainda nao eram milionários. E o vencer que eu digo nao é a vontade ganhar os jogos, isso todos tem...mas sim a vontade de um grupo e nao de um só querer aparecer.

Uma coisa eu sei...depois que o cara tá rico, fica bem mais dificil fazer ele obedecer...cada dia mais dificil.

Marimas disse...

Diana, em um Caique (colégio todo colorido da época do Collor/Itamar) em São Leo, no bairro Scharlau, 4 caras entraram no final da tarde na obra armados, querendo pegar o eng., que por acaso era meu pai, e o encarregado... por sorte, nenhum dos dois estava lá no momento. Mas aí não era coisa de bebum, o buraco era mais embaixo...

Resultado, dois dias de escolta da Civil na porta de casa, e transferência para São Gabriel... é... a rapadura é dura mesmo.

cjr-sp disse...

SOBRE O GRENAL DE HOJE...

ESSA É GENIAL....DO RAFAEL RODRIGUEZ LÁ DO VVI...

PLACAR PARA HOJE: 1X1

"porque 1 quase sempre fazemos, e 1 quase sempre o mao de alface toma."

SDS.
fui.

Marimas disse...

então vai ter penalti.. não deixem o nilmar bater.

Daniel Chiodelli disse...

Diana, quando terminei de ler o teu texto, a primeira coisa que me veio em mente foi o nome do Paixão.

"Há de se lembrar que naquele time, todos tinham sede de vencer, ainda nao eram milionários. E o vencer que eu digo nao é a vontade ganhar os jogos, isso todos tem...mas sim a vontade de um grupo e nao de um só querer aparecer."

É verdade, CJR.

col disse...

Imaginem a Diana dando xilique na obra...heheh

Muito boa a colocacao do Rafael Rodriguez.

Eu sugiro ao Louis fazer uma estatistica do tipo: "Clemer nao falha em um gol a x jogos".

Rodrigo - Internet/BV - Conselheiro disse...

Muito bom.

Imagino a Dianita na madruga tentando acompanhar o gayNAL. Que sofrimento será...

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